Um ano após as cheias no RS: do caos à lenta reconstrução
Quando o estado de calamidade pública foi decretado em todo o Rio Grande do Sul, no dia 1º de maio de 2024, há exatamente um ano, completado nesta quinta-feira (1º), a dimensão de uma tragédia já estava desenhada.
Até aquele momento, mais de 130 municípios contabilizavam prejuízos e o número de mortos e desaparecidos não parava de crescer. A situação ainda escalaria ao nível de uma catástrofe ambiental nos dias posteriores, como resultado de um volume de chuvas sem precedentes.
Um estudo divulgado pela Agência Nacional de Águas e Esgoto (ANA) nesta semana, produzido por um comitê de cientistas, concluiu que aquelas foram as piores enchentes da história do estado.
Porto Alegre, maio de 2024 – Aeroporto Salgado Filho ficou alagado e sem operar por cerca de 5 meses com as enchentes no Rio Grande do Sul – Rafa Neddermeyer/Agência Brasil
Ao todo, as inundações impactaram 478 das 497 cidades gaúchas, afetando diretamente cerca 2,4 milhões de habitantes. O número de vítimas fatais chegou a 184, além de 806 feridos e 25 pessoas até hoje dadas como desaparecidas. As cenas de cidades submersas em água chamou atenção do mundo inteiro.
Quase 200 mil pessoas ficaram desalojadas ou desabrigadas, e uma verdadeira operação de guerra foi deflagrada pelos governos locais e nacional, mobilizando forças de resgate de diferentes estados, que contaram com o apoio abnegado de milhares de voluntários também vindos de todas regiões o país, e uma rede gigantesca de doações.
No pico da emergência, o estado chegou a registrar 81,2 mil pessoas acolhidas em abrigos, sem contar famílias que improvisaram abrigos onde podiam.
Enfrentamento à calamidade
Ainda no auge da crise, a reportagem da Agência Brasil percorreu algumas das regiões afetadas, documentando os impactos no comércio e nas comunidades mais vulneráveis, incluindo aquelas populações historicamente invisibilizadas.
O poder público uniu esforços para tentar lidar com o caos. A suspensão da cobrança da dívida do Rio Grande do Sul com a União e a instituição de um auxílio emergencial de R$ 5,4 mil, que foi pago a 420 mil famílias, ajudaram a conter um cenário socioeconômico ainda mais grave.
Porto Alegre – Uma das 14 comportas e casa de bomba de drenagem de água, que cercam o rio Guaíba em manutenção – Joédson Alves/Agência Brasil
Programas estaduais e municipais de aluguel solidário e força-tarefa de profissionais da saúde também acudiram a população.
A enchente afetou 13,7 mil quilômetros de estradas no Rio Grande do Sul, entre rodovias federais e estaduais. Segundo o governo do estado, 94% dos trechos atingidos com algum dano já foram liberados, mas ainda há demanda por obras como pontes e outras estruturas.
Em balanço dos últimos dias, o governo federal apresentou a aplicação de R$ 111,6 bilhões em investimentos no estado. Da parte do governo estadual, os recursos alocados em diferentes frentes chegam a R$ 8,3 bilhões. Um indicador desse impulso seria o crescimento do Produto Interno Bruto (PIB, soma de bens e serviços) do estado, que subiu 24% em 2024, acima do PIB nacional (3,4%).
Reconstrução da infraestrutura
Rodovias interditadas devido às cheias sem precedentes no Rio Grande do Sul – Lauro Alves/Secom
Dias antes da catástrofe completar um ano, a equipe da Agência Brasil voltou ao estado. O que se viu foi o cenário de um Rio Grande não mais em situação calamidade, mas com um ritmo de vida que ainda não voltou a ser o mesmo.
Uma preocupação que já se notava durante a emergência agora ficou mais evidente: milhares de famílias que perderam suas casas ainda aguardam uma solução definitiva.
Alguns programas novos, como a Compra Assistida de imóveis, e a construção de moradias provisórias, ganharam mais velocidade nas últimas semanas, dando esperança de dias melhores a quem perdeu tudo.
Além do desafio das moradias, cuja demanda pode chegar a 22 mil imóveis, segundo o governo federal, o estado ainda está distante de resolver a infraestrutura de proteção contra novas tragédias ambientais causadas pelas chuvas, que prometem se repetir em um futuro não muito distante.
Colinas, maio de 2024 – O rio Taquari subiu 24 metros no auge da tragédia climática destruindo a pequena cidade de Colinas – Rafa Neddermeyer/Agência Brasil
O impasse na atualização de projetos estruturantes atrasa o início das obras necessárias, o que requer maior entendimento entre os diferentes entes da federação. Na avaliação de diferentes fontes ouvidas nos últimos dias, o processo de reconstrução completa ainda levará alguns anos para ser concluído.
A reportagem também registrou histórias de gaúchos resilientes do interior do estado e os que até hoje vivem em abrigos na região metropolitana.
Confira as reportagens do especial preparado pela Agência Brasil que marca esse um ano das enchentes no Rio Grande do Sul.